sábado, 18 de fevereiro de 2012


     Estou na praia e meus pensamentos, que não me dão trégua, surfam em minha cabeça: minha mãe na UTI, acessível apenas no horário de visita; meu neto a quem tenho que ensinar o significado de RSVP; Quérida, minha irmã e amiga do peito desde sempre, e que (grr) deu um pulo ao Espírito Santo ; a expectativa do almoço de hoje no prédio onde vovó morava etc.
         Esqueci de comprar “O Globo”. Enquanto espero uma estimada cunhada que mora no Leblon, homens passam correndo e falando de mulheres, e elas falam ao telefone sobre problemas familiares. Quem não os tem?
         Melhor mergulhar no livro, mas antes contemplar o mar, que minha mãe não pode mais apreciar; agradecer a Dumnezeu (Deus em romeno) pela beleza desse dia e pelos cuidados que minha mãe está tendo na Casa de Saúde, onde flagrei um senhor tão especial, que mesmo na UTI, beijou a mão de uma senhora que o visitava!
         Após as visitas diárias à nossa mãe, do lado de fora da Clínica, em assembléias familiares, Cristiano, para nos distrair, fala de lembranças preciosas, como, entre outras, a de nosso primo Ronnie, que, pequeno, e ainda por cima, gringo, não conseguia falar “Eurípides” e chamava o papai de uncle Lífero!
         Cláudia, a simpática arquiteta e mulher do Cristiano, que nos ofereceu um jantar muito gostoso, vendo uma bonita casa perto da Clínica, que Cristiano foi nos mostrar, comenta que ali não batia sol e que “casa onde o sol bate médico não entra”, ao que ele retruca: - Coitado dos médicos, nem podem entrar em casa!
         Outra hilária da família é a Quérida, para os que não a conhecem, Regina, que chegou do Espírito Santo e me contou que ao vir embora, viu umas chavinhas dentro do armário e, pensando que raio de chaves seriam aquelas, cogitou em jogá-las fora , sem contudo chegar a esse extremo. Bateu a porta do apartamento e foi para o aeroporto. Instalada em seu lugar de destino, descobriu que as chaves negligenciadas eram as de suas malas.

sábado, 4 de fevereiro de 2012


                            Momentos cariocas

        Estou no Rio e triste como o ramo de uma árvore, cuja raiz está prestes a ser arrancada. Minha mãe, muito querida por todos que a conhecem, com noventa e cinco anos e osteoporose no mais alto grau, quebrou o nariz, o braço, teve hemorragia interna, engoliu sangue a noite inteira, e a bola de neve foi crescendo: foi entubada, teve pneumonia aspirativa, febre, convulsões que a deixou em coma superficial, e, numa segunda fase, traqueostomizada.
        Como só posso ir ao hospital à tarde, no horário de visitas, fui à praia.
        No pequeno ônibus, uma passageira pede ao motorista que pare perto de um canal, antes ou depois do Jardim Botânico; cariocas que somos, todos interagimos: O canal fica antes, depois, na frente, visível daqui, na rua de trás, há dois canais, enfim, quase pedindo ao motorista que diminuísse o ar condicionado, por causa do passageiro que estava espirrando, desço do ônibus relativamente satisfeita com o espírito brasileiro . Na praia, o orgulho de minha nacionalidade cai por terra, ao abrir “O Globo” e ler que “O prefeito de São Paulo ofereceu 4,4 mil metros quadrados ao Instituto Lula! Não acredito que o próprio Lula não vá rejeitar oferta tão descabida em um país que, precisando urgentemente de hospitais e colégios, se dá ao luxo de dispor de uma área para construir um Memorial da Democracia, com acervo público para contar a história dos movimentos sociais brasileiros, oferecendo entrada gratuita para estudantes da rede pública.”  
         Nem se contasse à meninada as roubalheiras dos dólares nas cuecas, meias e bolsas ou a compra de um mega avião e de propriedades riquíssimas, ou dos diversos enriquecimentos ilícitos e demais bandalheiras, seria válido se gastar dinheiro público com um projeto tão fútil.
        Miguel Torga disse um dia “É um fenômeno curioso: o país ergue-se indignado, moureja o dia inteiro indignado, come, bebe e se diverte indignado, mas não passa disso. Falta-lhe o romantismo cívico da agressão. Somos, socialmente, uma coletividade pacífica de revoltados.” 
        Somos tal qual o povo português, mas, quem conhece o Kassab, para lhe falar de sua insanidade?
        Aqui faço a minha parte, ou seja, o protesto digitado.