(Depois de transcrever "Sob os escombros" tive vontade de trazer à tona o que escrevi há algum tempo.)
Filho, seu carma será voltar como mãe. São 3h25 da madrugada.
Mães geralmente acordam cedo, mas não tanto. É que ainda não dormi. Estou
dialogando com seus tios lá do céu, que supostamente devem nos proteger, e até
apelando para os santos.
– Afinal, resolva. Quer que ele chegue são
e salvo ou quer que ele chegue logo? -
– Não dá para atender dois pedidos de uma vez? Aladim concede três...
A hora vai passando. Depois de parlamentar em vão com a secretária eletrônica, o jeito é hipnotizar por telepatia.
– Filho, você está com sono, muito sono, mas cuidado, olhe o poste! Está com uma vontade irresistível de voltar para a casa. Volte...
4 horas. A via crucis da mulher não é fácil. De dia os afazeres. De madrugada as preocupações.
A hora vai passando. Depois de parlamentar em vão com a secretária eletrônica, o jeito é hipnotizar por telepatia.
– Filho, você está com sono, muito sono, mas cuidado, olhe o poste! Está com uma vontade irresistível de voltar para a casa. Volte...
4 horas. A via crucis da mulher não é fácil. De dia os afazeres. De madrugada as preocupações.
– Sinta-se hipnotizado... (Já é tarde, queimarei um cartucho. Apelarei ao Supremo, visto os santos estarem
dormindo.) – Filho, onde está seu bom senso? Sabe o
que deixarei de herança? Saúde, bom senso e senso de humor. As três coisas mais
importantes desta vida. Tendo isso, o amor virá. Quando já de saída, você me perguntou onde eu
estivera a tarde toda – tal pai, tal filho – desculpe-me ter respondido mal. É que
fui a tantos lugares que dava nem tempo de enumerá-los. Você já dobrava o
corredor. Além da preguiça da longa lista: lavanderia, costureira, cabeleireiro,
engarrafamento, Banco, médico, supermercado, sapateiro (curioso, a única profissão
onde não há mulheres ainda...). Bem, a gincana do dia-a-dia de uma mulher. Tudo
isso em uma tarde. E você, em uma noite? Sentado, jogando; acocorado, trocando
pneu; deitado, transando? Se cuida, você vai voltar mulher... Um dia acordando às
5h30, no outro, pregando o olho às cinco. Homens renascerão mulheres. Não é
praga. É carma. O rodízio é o nosso consolo. Até porque seria injusto se assim
não fosse. Mas, quando você chegar, vou perguntar:
– O que aconteceu, filho?
Trouxe ao menos pão quentinho? – Ô de casa! Ô lá de cima, estão todos cochilando? Quero dormir! Um dia vocês me dão
uma insônia, no outro são os filhos que não chegam. Quousque tandem? Vou já pedir minha aposentadoria de mãe.
– Varou a noite estudando?
Tem
mãe que é cega... Mas acredito no que quero. Nisso puxei à minha mãe, que puxou
à dela, que puxou..., que puxou à Eva.
E eu que não ia escrever! Para quê, pensei. São dois pensamentos, três linhas. Mas comece, porque sairá igual lenço de cartola de mágico. E aí você não dormiu, mas escreveu. Afinal, não ia dormir mesmo. Qual a mãe que nestes tempos de desenfreada violência o consegue?
E eu que não ia escrever! Para quê, pensei. São dois pensamentos, três linhas. Mas comece, porque sairá igual lenço de cartola de mágico. E aí você não dormiu, mas escreveu. Afinal, não ia dormir mesmo. Qual a mãe que nestes tempos de desenfreada violência o consegue?
6h30. Arrisquei e
levantei-me para ver se, por um acaso, ele já havia chegado. Pasmem. Estava tranquilamente dormindo.
– Obrigada, quem quer que tenha me escutado. Devo começar o dia, como
antigamente, com uma oração. Só espero que o carro também esteja na garagem,
sem qualquer escoriação.
Como veem,
trair, roubar e escrever é só começar.
Águas rolaram desde que hipnotizei Filho Varão pela primeira vez. Orgulhei-me
de sua aprovação em vários concursos, mas às vezes ainda hipnotizo ora Filho
Varão ora Filha Antropóloga, quando se prolongam fora de casa noite adentro.