Ao final da missa de sétimo dia parecíamos conformados com a “velinha” extinta. Fora melhor para ela – dizíamos – avançada em anos, não falava mais, quase não ouvia e totalmente dependente, até para andar.
Mas sua ausência sempre presente tornou o sofrimento elástico. Quanto mais o tempo se dilata, maior é a saudade, contrariando o ditado "longe dos olhos, longe do coração".
Ao final da missa de trigésimo dia, parecíamos contentes, abraçando irmãos, primos e amigos não vistos por muito tempo. Ficara surpreendida. Minha mãe se fora, e eu, que tinha certeza que desabaria quando isso acontecesse, estava firme como rocha!
Ignorava que a dor cravada lá no fundo, iria aflorar pouco a pouco, sempre e com toda a fúria, na mesma intensidade do punhal que,à medida que se retira,traz em sua lâmina carne viva, sangue e lágrimas.
De que adianta meu dom de achar o que se perde? Queria achar a minha mãe!
Ao que, com o intuito de me consolar, um amigo escreveu: Angela, você não vai encontrar sua mãe por um motivo muito simples: você não a perdeu.
Fiquei com os olhos cheio d'água, mas minha irmã Quérida disse que eu a tinha dentro de mim.
Realmente, no entanto não a sabia tão chorona...
E, entre lágrimas; arrumações cada vez mais esporádicas de prateleiras e gavetas (sempre que termino uma faxina, penso: agora sim, a casa estaria pronta para receber a minha irmã, que afinal não veio. O tempo passa, arrumações são novamente necessárias, no eterno trabalho doméstico nunca valorizado, mas reconhecido por quem o realizou e isso quase que basta) e o acompanhamento pelo Facebook da escalada do meu neto primogênito ao Pico da Bandeira, mergulho em "Se una notte d’inverno um viaggiatore", de Italo Calvino, em uma re-releitura, desta vez no original, para aprender uma língua nova,tentando afastar a doença de Alzheimer, de maneira pra lá de prazerosa.Delícia de livro. Acordo com todo o gás, louca para abri-lo.
Leio, agradecendo a quem me deu esse grande interesse e ocupação, mas de vez em quando, surge a vontade de emergir para compartilhar o meu fascínio. No entanto, me contenho, pois as pessoas vivem mundos diferentes e as diversas fases não coincidem. Quando estou pairando nas alturas de um enlevo literário, outras estão chegando a casa, cansadas, sem ânimo ou tempo para curtirem as páginas que me deixam feliz.
Comecei este e-book após a morte de meu pai e o termino hoje,sem ambos os pilares de minha estrutura, dia oito de julho, data em que minha mãe, muito amada, faria 96 anos,e,pela primeira vez,não podendo abraçá-la, deixo-lhe um grande beijo em sua alma, esteja ela onde estiver...
Ângela querida, que lindo relato emocionante e que me sacudiu as raízes!
ResponderExcluirEm homenagem À Maricota, escrevi o poema que vou postar aqui para você em especial.
Beijos e obrigada por compartilhar tantas emoções!
RÉQUIEM PARA MARICOTA
Vivemos um 8 de julho sem Maricota e seu azul!
Tivemos de nos contentar com o gris!
As tintas se espalham em desalinho.
O frio se impõe sobre nós.
Tornamo-nos mais pensativos.
As lágrimas banham meus olhos
Que se afogam na escuridão
Porque reclamam a tua luz
Sobreviver ao inverno glacial
E o que faremos sem o teu perfume?
A tua leveza não veste mais o presente.
Recriamos o teu sol radiante
Agradecemos pela dádiva
De ter sido tocados pela tua beleza!
Nathalia Leão Garcia
Obrigada, digo eu, Nathália, por esse Réquiem tão lindo. Estou emocionada. Ainda durmo chorando, caminho chorando,faço ginástica em lágrimas, ouço música em lágrimas, como chorando, enfim, faço tudo o que preciso fazer, mas sempre chorando, embora sem deixar que outros percebam, mas acho que serei como o papai que chorou a vida inteira a perda de seu pai...
ExcluirOla, Angie!!! Tenho um blog!!!!!!!!! com ajuda da Nathalia...depois volto beijo!!
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