Momentos cariocas
Estou no Rio e triste como o ramo de uma árvore,
cuja raiz está prestes a ser arrancada. Minha mãe, muito querida por todos que a conhecem, com noventa e cinco anos e osteoporose no mais alto
grau, quebrou o nariz, o braço, teve hemorragia interna, engoliu sangue a
noite inteira, e a bola de neve foi crescendo: foi entubada, teve pneumonia aspirativa, febre, convulsões que a deixou em coma
superficial, e, numa segunda fase, traqueostomizada.
Como só posso ir ao hospital à tarde, no
horário de visitas, fui à praia.
No pequeno ônibus, uma passageira pede
ao motorista que pare perto de um canal, antes ou depois do Jardim Botânico; cariocas
que somos, todos interagimos: O canal fica antes, depois, na frente, visível
daqui, na rua de trás, há dois canais, enfim, quase pedindo ao motorista que
diminuísse o ar condicionado, por causa do passageiro que estava espirrando,
desço do ônibus relativamente satisfeita com o espírito brasileiro . Na praia,
o orgulho de minha nacionalidade cai por terra, ao abrir “O Globo” e ler que “O prefeito de São Paulo ofereceu 4,4 mil metros quadrados ao Instituto Lula! Não
acredito que o próprio Lula não vá rejeitar oferta tão descabida em um país que,
precisando urgentemente de hospitais e colégios, se dá ao luxo de dispor de uma
área para construir um Memorial da Democracia, com acervo público para contar a
história dos movimentos sociais brasileiros, oferecendo entrada gratuita para
estudantes da rede pública.”
Nem se contasse à meninada as roubalheiras dos
dólares nas cuecas, meias e bolsas ou a compra de um mega avião e de
propriedades riquíssimas, ou dos diversos enriquecimentos ilícitos e demais
bandalheiras, seria válido se gastar dinheiro público com um projeto tão fútil.
Miguel Torga disse um dia “É um fenômeno
curioso: o país ergue-se indignado, moureja o dia inteiro indignado, come, bebe
e se diverte indignado, mas não passa disso. Falta-lhe o romantismo cívico da
agressão. Somos, socialmente, uma coletividade pacífica de revoltados.”
Somos
tal qual o povo português, mas, quem conhece o Kassab, para lhe falar de sua
insanidade?
Aqui faço a minha parte, ou seja, o protesto digitado.
Aqui faço a minha parte, ou seja, o protesto digitado.
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