Curiosidade e ânsia para os novos Visitantes, mas já quase rotina para
mim, face às três antecedentes viagens similares. De início, apenas uma
diferença desta vez: o circuito seria o inverso do habitual – entrada por
Lisboa e o regresso pelo Porto, via capital. Portanto, acertada a combinação
com a empresa transportadora (já também habituada a estas andanças, pois foi
ela a utilizada desde a primeira jornada, mercê de contactos por mim efetuados,
por conhecer os seus bons serviços, e preços competitivos, no âmbito de
excursões do meu clube rotário, e que a Sônia da Interline entendeu dar
continuidade), eis-me sentado na camioneta às duas horas da madrugada, depois
de um pequeno desvio feito pelo motorista para me apanhar no caminho, rumo a
Lisboa, buscando os novéis visitantes, fazendo um esforço enorme para não
adormecer a fim de evitar um eventual contágio ao condutor, por osmose.
Estacionada a viatura no Aeroporto num ponto mais próximo possível da porta de
saída para amortecer o prolongamento do cansaço da viagem do Brasil, aí estou
eu esperando o pessoal, juntamente com o prestimoso motorista, Sr. Nelson.
Feitos os primeiros contactos, deu para perceber, de imediato, que,
apesar do Sr. Comendador ter informado convenientemente os visitantes do meu
papel e função nesta andança, segundo julgo saber, nem toda a gente terá
apreendido bem isso e fui, então, confundido como sendo um ajudante de
motorista ou representante da empresa transportadora. Bom, procurando desfazer
equívocos, lá fui eu dando início àquilo que julgava ser a minha tarefa em
Lisboa, razão pela qual tinha acedido à insistência do Victor Alegria em ir à
capital: assessorá-lo (a ele) no que fosse necessário, face às suas
condicionantes físicas, sem prejuízo de eventual apoio aos circunstantes,
embora limitado, uma vez que em Lisboa também sou forasteiro, conhecendo
todavia bastante bem a cidade e zonas limítrofes. Mas era incompatível
articular as duas satisfações: orientar e ajudar uns e, simultaneamente, apoiar
o Victor. Fiz marcação em Hotel para o período da minha estada na capital, mas
limitei-me a, no último dia, já com contas previamente acertadas, ir entregar a
chave nunca utilizada. O Sr. Comendador “obrigou-me a dormir com ele!” Quem lhe
iria botar as gotas nos olhos???...
Mas o motorista já tinha sido instruído em conformidade e não deixou,
portanto, de proporcionar um passeiozinho pelas zonas da cidade mais
turisticamente procuradas, bem como o tradicional salto à linda vila de Sintra,
com seu Palácio da Pena majestoso. Dia seguinte, com marcação protocolar
estabelecida na Biblioteca Nacional de Portugal, a delegação foi recebida pelo
seu então Diretor, Prof. Dr. Jorge Couto, cerimónia durante a qual tive então a
oportunidade dum contacto mais íntimo com os integrantes da comitiva. Deu para
entender aí, então, durante a descrição dum excerto dum livro, pela autora, da grande
qualidade e sensibilidade dos presentes, pois outras intervenções se sucederam de
similar amplitude.
Iniciada a viagem com destino ao Porto, eis-nos a visitar o Mosteiro de
Alcobaça, monumento português incontornável para quem se desloca àquela zona do
país, não só pela sua componente religiosa e histórica mas também por conter os
túmulos da galega Inês de Castro e do seu D. Pedro, figuras que se tornaram
míticas na nossa História e Literatura e cujo amor foi contado e cantado em
lindas trovas, pois nem o trágico desenlace o apagou. Inês foi coroada rainha
mesmo depois de morta.
De seguida, aí vamos nós para Aljubarrota, pois tínhamos à nossa
espera, em sua casa, um amigo de Brasília, e sua esposa, cidade onde viveram
uns anos, ele em funções de âmbito diplomático, no Instituto Camões, após o
que, antes de se aposentar, foi nomeado responsável pelo Mosteiro que tínhamos
acabado de visitar.
Rui Rasquilho e sua amável esposa receberam a Comitiva à boa maneira
portuguesa – É Uma Casa Portuguesa, Com
Certeza, não diz assim a canção? -, não só pelas suas ligações a Brasília como
também pela simpatia intrínseca que irradiam.
Findo o fasto repasto e as despedidas comovidas, partimos para visita
ao Mosteiro da Batalha, monumento gótico português erigido em memória duma
Batalha ocorrida em 1385 na localidade onde Rui reside (Aljubarrota), pela qual
os portugueses derrotaram os castelhanos, não obstante o número de tropas
destes ser o quádruplo das comandadas por D. Nuno Álvares Pereira.
Chegados à cidade do Porto,
formalidades no Hotel cumpridas e descanso merecido, pensando já, todavia, no
programa do dia seguinte, também ele promissor de alguma azáfama.
Visita a Caves do Vinho do Porto, em Vila Nova de Gaia.
Atendendo a que esta viagem tinha como desígnio a visita às nascentes da língua
e da cultura portuguesa e considerando que a Galiza detém na sua história uma
raiz comum inapagável, foi dado cumprimento a algo que já vinha germinando nas
mentes organizativas destas Viagens: estabelecer-se um programa de visita a
Santiago de Compostela e a outras terras vizinhas de relevo cujos detalhes
programativos seriam da responsabilidade galega, articulada connosco. Assim se
pensou, assim se fez. E eis-nos, portando, de abalada para a mítica cidade de
Santiago de Compostela.
Mas, no caminho, almoço especial nos esperava. Dia de
aniversário dum visitante com sangue galego – José Jerónymo Rivera – assim como da simpática Cecília Velho, e
cantou-se os “Parabéns a Você”
saboreando um belo bolo que o motorista, amigo Nelson, teve a ideia e a notável
amabilidade de oferecer. Gesto bonito, destacável e inesquecível.
Mas o destino era
Santiago, com gente amiga nos aguardando. Arrumada à pressa, portanto, a
bagagem no Hotel, e com a Concha Rousia à espera, grande amiga galega destas
lides, lá nos dirigimos para o riquíssimo evento cultural que a AGLP – Academia Galega de Língua Portuguesa,
com sede naquela mítica cidade, teve a amabilidade de nos contemplar.
Assistimos a um lindo concerto em que a emoção floresceu, não só pela qualidade
da poesia declamada e pela música erudita executada pela Professora do
Conservatório de Santiago de Compostela Isabel Rei Sanmartim, mas, e
principalmente, pelo ambiente humano e empolgante.Troca de lembranças e retorno
ao Hotel, pois o cansaço já aflorava e o dia seguinte prometia ser
efervescente. Assim aconteceu, e, pela manhazinha, tendo uma brasilega à espera
para nos ciceronear Santiago, fomos conduzidos por Jeanne Pereira, uma bahiana
residente há já uns anos em Santiago (regressou definitivamente, entretanto, ao
Brasil, mas continua a sentir e a viver a alma galega), aos pontos
mais emblemáticos de Compostela. Após um curto almoço-convívio, para evitar
perdas de tempo necessário, fomos visitar a Catedral de Santiago.
De seguida, Concha e o marido, assumindo o papel de guias turísticos,
no nosso Autocarro, conduziram-nos à localidade de Rianxo, em pleno coração
galego. Em Rianxo – vila marinheira típica onde se vai abrir um centro da
Universidade Aberta de Lisboa, tínhamos
a aguardar-nos, o respetivo Presidente da
Câmara Municipal (Prefeito).
Despedidos da Galiza, rápidos na estrada para a Invicta, porque
tínhamos um jantar especial à nossa espera, seguido de evento cultural na UNICEPE – Cooperativa Livreira de Estudantes
do Porto, durante o qual seriam apresentados livros de alguns escritores
integrantes da caravana. Canções lindas tocadas e cantadas, intervenções de
conteúdo importante se fizeram, com público assistente em quantidade e
qualidade.
Dia seguinte, cedo abalámos rumo à terra natalícia de Victor Alegria,
onde pernoitaríamos, pois visitar Arouca obriga a permanência prolongada, tal a
riqueza do seu acervo. Mas Victor trazia na bagagem, da Thesaurus, um livro dum
poeta de raiz arouquense, Nuno Brito, detentor já de prémios literários, para apresentação
naquela vila, tarefa entregue ao Prof. Doutor Arnaldo Saraiva, professor
jubilado da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, uma das pessoas mais
credenciadas em Portugal sobre literatura brasileira, e, cumulativamente, velho
amigo do Sr. Comendador.
À noite, fomos pomposamente brindados com um majestoso concerto de
Órgão de Tubos do Mosteiro de Arouca, privilégio especial, seguido duma Ceia,
tipo Medieval, na Cozinha do monumento, evento também reservado a um número reduzidíssimo
de entidades.
Mas … Arouca detém geosítios tombados pela UNESCO razão por que, manhã
cedo, o vasto espólio a isso obrigava, fomos ver e desfrutar um fenómeno só
existente aqui e noutro local do planeta, na Rússia: as denominadas “pedras parideiras”, ou seja, um
afloramento de granito com abundantes nódulos discoides e biconvexos de
biotite, que se libertam da rocha-mãe, por termoclastia.
Como o estômago já apertava, e porque o almoço estava aprazado, lá nos
embrenhámos por caminhos e ladeiras, carreiros e veredas, camioneta roçando
árvores e arbustos, que só a destreza do amigo Nelson conseguia vencer, chegámos
finalmente ao Espinheiro, em cuja folhagem se descobriu, embora ninguém visse,
o Restaurante desejado. Foi pelo cheiro que o alcançámos.
Acabado o repasto, dirigimo-nos, com guia competente, ao Museu das
Trilobites, fósseis de maior importância,
para estudo da origem e evolução da vida na Terra, pois estes animais
viviam em águas profundas ou em águas superficiais e se extinguiram rapidamente
há cerca de 230 milhões de anos. Muito mais haveria a visitar, mas o tempo,
sendo escasso, não permitia mais incursões.
Finda a inesquecível Viagem, para uns, porventura, empolgante, seria
deselegante da minha parte destacar qualquer elemento integrante da Caravana,
todavia, pedindo desculpa aos demais, considero incontornável, para mim, não
poder deixar de citar aqui dois nomes: Manuel
Mendes, decano do grupo e proeminente jornalista e escritor, pelo seu
denodo e coragem face às milhas a vencer, não obstante as suas limitações
físicas; e Santiago Naud (figura cujo
nome e parte de cuja obra literária já conhecia), pela sua assumida
portugalidade (cito o Livro 47 Poemas
Lusitanos), e pelo seu expresso amor ao Porto, minha cidade.
Todos vocês chegaram a terras lusas como Embaixadores do Brasil, e
todos, estou seguro, regressaram agora acumulando o cargo de Embaixadores de
Portugal.
Bem hajam!
Porto, 15 de janeiro de 2012.
Carlos Jorge Mota
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