sexta-feira, 5 de abril de 2013

Arroz - Roberto Klotz


Para cozinhar, antes de tudo, são necessárias ousadia, coragem e fé.
Minha filha passou por aqui ontem e deixou-me um bilhete dizendo que viria almoçar em casa.
           Num rápido diálogo com os botões da minha camisa, resolvi que era hora de caminhar com os próprios pés e demonstrar que eu já sabia fazer outras coisas na cozinha além de esquentar pizzas, descongelar lasanha e cozinhar miojo. Em tempo algum imaginei competição com a mãe dela. Apenas gostaria de externar meu carinho e fazer uma comidinha saudável e caseira.
          Chegou o grande momento. Vou fazer arroz pela primeira vez.
          Nem preciso de receita, tenho ótima memória e me considero bastante criativo para sair de qualquer embaraço.
          A primeira coisa é abrir o pacote de arroz. Antigamente era necessário escolher arroz, hoje também. O preço é muito variável de um supermercado para outro.
          Seremos apenas nós dois, logo, basta uma porção para cada um. Não quero que minha filha julgue que eu seja sovina. Meço três copos caprichados de cristal Cica. O próximo passo é lavar o arroz. Ainda bem que eu me lembrei disso a tempo. Faço questão de ter o arroz mais bem lavado que minha filha já comeu. Coloco num pirex e deixo de molho com um pouquinho de detergente.
          Sempre questionei a linguagem da cozinheira: Deixar de molho? Será que tenho que temperar para deixar com cara de molho?
          Minha filha terá mais orgulho de mim, se eu fizer um arroz , tem de ser colorido e saboroso.
          Farei arroz à grega, é isso.
          Da geladeira, eu pego duas cenouras, uma para ela e outra para mim. Da dispensa, pego uma lata de ervilhas e outra de milho, uma para cada um.
          É importante temperar. Ouvi dizer que bastam cebola, alho e sal. Eu não gosto de alho. Alho é bom para a memória. A gente lembra o que comeu até o dia seguinte.
          Descasquei a cebola e cortei em rodelas. Declaro, a quem interessar possa, que não chorei. Macho não chora. Foi só uma lagrimazinha discreta e ninguém viu.
          Coloquei uma grande panela no fogo e coloquei uma colherzinha de óleo. Eu nunca sei o nome certo para os procedimentos culinários. Parece-me que agora o nome é refogar. Eu ainda acho que é fritar na panela. Pois bem, com o óleo bem quente, frito as fatias de cebola e lanço uma colher de sal. Jogo fora a água do arroz e das latas de ervilhas e milho. Frito tudo junto com as cebolas. Quase esqueço das cenouras cortadas em cubos pequenos como se fossem milho ou ervilhas.
          Para cozinhar o arroz, acrescento dois copos de água.
          Agora é só mexer um pouquinho e logo estará pronto.
          Mexe, mexe, mexe.
          E agora? Acho que eu deveria abaixar o fogo. As ervilhas derreteram. Isso aqui está muito quente. Acho que está faltando água. Da geladeira pego a garrafa d´água novinha da minha filha, meço mais três copos e acrescento ao arroz. Observo o resultado e concluo que o nome certo é afogar o arroz e não refogar. Mexo mais um pouquinho a maçaroca empapada gigante e entendo que meu arroz não sobreviverá
          Melhor comprar arroz pronto no chinês perto de casa.
          Retorno para casa, com uma quentinha de frango xadrez e outra de arroz.
          Minha filha chegou em seguida.
          Contei a minha aventura nos procedimentos do arroz. Ela não achou graça nenhuma. Insinuou que eu devia estar bêbado por fazer tanta coisa errada. Protestei. Ela ainda me perguntou quem havia bebido toda aquela vodca da garrafa novinha da geladeira.

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