Ouvi muitas vezes que o passado e o futuro não existem.
Que só lidamos verdadeiramente com uma dimensão
de tempo: o agora. O passado teria ficado para trás,
fora do alcance até do retrovisor, que só alcança o
que é mais recente, o quase agora. O futuro estaria na
ordem do prematuro, do ainda inexistente, seria uma
espécie de talvez, diluída em bilhões de hipóteses, todas
impalpáveis, incertas. Portanto, o conselho era que o
foco estivesse no dia de hoje ou mais, no momento
presente, numa estreita, exígua fatia de tempo, que mal
cabia na palma de minha curiosidade.
Essa orientação causou em mim uma certa tendência
imediatista, a angústia provocada pelo conhecimento de
que a existência consistia num único passo, pois o próximo
já pertenceria ao futuro e, portanto, seria somente uma
conjectura. E de pouco valeria a memória do que já havia
sido, pois isso pertencia ao mundo do que não pulsa mais.
E lá fui eu, como um saci, sobre uma perna só, tentando
equilibrar-me no estreito espaço do aqui e agora, onde nada
que existe demora, onde não existe hora, só segundo. Ao
menos, segundo os profetas da instantaneidade.
Confesso que não me senti muito bem. Eu queria mais, não
me satisfazia aquela situação tão provisória, em que a vida,
entendida como um átimo de qualquer coisa, escorria pelos
dedos dos tempos. Cheguei a abolir o uso do relógio, pois
se tudo que me pertence é o agora, os ponteiros não teriam
nada de útil a me informar. Além disso, poderia o relógio
constituir-se em instrumento delirante, pois remeteria ao que
está por vir e, por assim ser, inexiste.
Hoje, sinto a vida de outra maneira, numa perspectiva mais
humana e aconchegante, tridimensional. Passado, presente e
futuro andam sempre juntos, dialogam numa boa, desconhecem
qualquer hierarquia. Eles estão em mim, trafegam pelas avenidas
largas de minha imaginação, sem colisões, conflitos ou disputas
de espaço. Permito-me transitar pelas três dimensões, sem me
perder de mim. Adoro o que vejo nessas viagens, que dispensam
passaporte. Sou cidadão de um universo, em que se fala o idioma
do verso. Aqui a medida de tempo é a emoção que escorre de cada
sílaba para formar a próxima. Neste lugar nada nasce nem morre,
tudo simplesmente é.
E-book com futuras contribuições alheias e sempre com uma música de fundo.
quarta-feira, 29 de agosto de 2012
terça-feira, 28 de agosto de 2012
Ficção ou realidade? Fique são!
Ficção ou realidade? Fique são!
Cair na real?
Decido permanecer de pé,
pé ante pé, ante tantos perigos.
Realidade é cimento, concreto,
é ciumento projeto que proíbe outras versões?
Como assim, se não abro mão nem dos pequenos versos?
Quero os verões para transpirar a saudade
e o inverno para aquecer-me na chama.
A chama da vida me chama, ávida e por isso mais viva.
Deixem-me com minhas intuições ilógicas,
com minha lógica intuitiva,
com a serenidade aflitiva
que é meu emblema.
Feito um poema
que nem preciso escrever.
Só ser.
Cair na real?
Decido permanecer de pé,
pé ante pé, ante tantos perigos.
Realidade é cimento, concreto,
é ciumento projeto que proíbe outras versões?
Como assim, se não abro mão nem dos pequenos versos?
Quero os verões para transpirar a saudade
e o inverno para aquecer-me na chama.
A chama da vida me chama, ávida e por isso mais viva.
Deixem-me com minhas intuições ilógicas,
com minha lógica intuitiva,
com a serenidade aflitiva
que é meu emblema.
Feito um poema
que nem preciso escrever.
Só ser.
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Helcio Maia
sexta-feira, 24 de agosto de 2012
As Cariátidas - Anngela Delgado
Ligo o computador, dou bom-dia à minha mãe em meu plano de fundo.
Bem ao lado de seus olhinhos vivos, a Claro me informa que estou off line. Quem me dera se Steve Jobs, lá de cima mesmo, pudesse nos proporcionar a maravilha de, ao justapor a seta à imagem, pudéssemos trazê-la para um papo on line....
Ontem, fui buscar um dos meus netos no Shopping. Antes, dou uma entradinha à procura de uma bolsa e saio de lá, com um lindo dicionário de italiano, que agora está aqui ao meu lado, transfigurado em "professore", pronto a me auxiliar, como por exemplo se eu tiver uma dúvida neste parágrafo, de “Se una notte d´inverno um viaggiatore”, do Italo Calvino:
“... dona di temperamento sensibile e inquieto, che risente dell´isolamento cui la costringono la dislocazione geografica, ma è sostenuta dalla sua insaziable passione per la lettura...” (Ecco sono io!)
“La moglie del Sultano non deve mai restare sprovvista (desprovida) di libri di suo gradimento (agrado) : cè di mezzo una clausola del contratto matrimoniale, una condizione che la sposa ha posto al suo augusto pretendente prima (antes) d´acconsentire alle nozze... Dopo una placida luna de miele in cui la giovane sovrana riceveva le novità delle principali letterature occidentali nelle lingue originali che lei legge correntemente, la situazione è diventata spinosa... “ (difícil)
Gostei da mulher do sultão, e do livro então, nem se fala!
Coincidentemente, recebi hoje, um convite para ir à Grécia e à Itália! Ecco,uma compra bem oportuna a do dicionário. Começara a estudar italiano, ignorando que em breve estaria (estarei) usando palavras como: Mi fa piacere, Come se chiama, Benissimo, Lunedì, Martedì, Mercoledì, Giovedì, Venerdì,Sabato, Domenica, Domenica sera,Volentieri, Buonasera, e così via (etc.).
O plano do ano passado era ir à Hungria e à Tchecoslováquia e já estava me familiarizando com expressões bem mais difíceis, quando minha cunhada levou um tombo, e com ele caiu também por terra o passeio planejado, pois, sem nossa Locomotiva, a viagem não tinha mais sentido.
Este ano o roteiro é outro e tento decorar, além das palavras fáceis em italiano, palavras em grego...: Parakaló (por favor), Sas efaristó (obrigada), Signomi (desculpe), Póso Káni? (Quanto custa?), Kaliméra (Bom-dia) e kalinixta (boa-noite).
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Angela Delgado
terça-feira, 14 de agosto de 2012
Carta aberta a um poeta
Obrigada, Marcelinho, pelos belos comentários. Realmente minha mais nova descoberta é um senhor escritor, que deve ter ficado também bem impressionado com o poeta Marcelo. Passei o domingo inteiro lendo o blog dele e ontem acordei com ressaca literária, no bom sentido, claro! Mas, eu devia ter agido como você fará e lê-lo aos poucos. O que aconteceu foi que, para não ter que voltar em cada um dos duzentos posts para comentar, fui lendo e comentando, lendo e comentando. Uma vez, para voltar aos textos, tão enfeitiçada estava, um breve comentário: Ai,delícia! Deveria ter acrescentado que o Michel Teló não sabe o que é delícia... Resultado, me tornei uma potência em comentários e nem o deixei ler meu blog, por causa do "duelo de afagos", como ele disse.
Eu lia, comentava e ele respondia. Lia, comentava e ele respondia. Arre! Foi um ótimo domingo, mas agora vou dar um tempo. Para não cair na tentação de fazer o milésimo comentário, farei como faz quem quer parar de fumar, direi a mim mesma: só por hoje. Mesmo porque ele precisa acessar o seu blog, o do Luiz e trabalhar... acho que ainda no Banco do Brasil, que, insuspeitadamente, é cheio de gente da mais alta categoria...
O diabo é que meu notebook rapidamente se viciou no www.artevida. Vou deixá-lo hibernando enquanto, meio a contragosto, darei uma caminhada; pegar um pouco de sol, ouvindo música; cuidar da casa, das plantas e, como era de se esperar, voltar ao Italo Calvino, que está morto de ciúmes.
Se o viciado aqui não aguentar, te aviso e você me envia o que de novo houver e eu faço o comentário só pra você, que tal? Arrependi-me de ter tomado tanto tempo dele. Imagine, um candidato em potencial ao Nobel ficar se ocupando com uma ilustre desconhecida.
Quando disse isso a ele, ele desembainhou sua espada literária e reverteu para "desconhecida ilustre" etc e tal. Que gentil!
Eu lia, comentava e ele respondia. Lia, comentava e ele respondia. Arre! Foi um ótimo domingo, mas agora vou dar um tempo. Para não cair na tentação de fazer o milésimo comentário, farei como faz quem quer parar de fumar, direi a mim mesma: só por hoje. Mesmo porque ele precisa acessar o seu blog, o do Luiz e trabalhar... acho que ainda no Banco do Brasil, que, insuspeitadamente, é cheio de gente da mais alta categoria...
O diabo é que meu notebook rapidamente se viciou no www.artevida. Vou deixá-lo hibernando enquanto, meio a contragosto, darei uma caminhada; pegar um pouco de sol, ouvindo música; cuidar da casa, das plantas e, como era de se esperar, voltar ao Italo Calvino, que está morto de ciúmes.
Se o viciado aqui não aguentar, te aviso e você me envia o que de novo houver e eu faço o comentário só pra você, que tal? Arrependi-me de ter tomado tanto tempo dele. Imagine, um candidato em potencial ao Nobel ficar se ocupando com uma ilustre desconhecida.
Quando disse isso a ele, ele desembainhou sua espada literária e reverteu para "desconhecida ilustre" etc e tal. Que gentil!
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Angela Delgado
sábado, 11 de agosto de 2012
O fio da palavra - Tarlei Martins Ferreira
A palavra falada não passa de uma rajada acústica, de um aglomerado de sons. A palavra escrita não passa de um aglomerado de traços. Contudo, é espantoso o que pode uma palavra carregar de sentido, de significado, de sopro de vida inscrito na sua superfície. Eu fico pasmo. É o fio da palavra que nos leva a todos os lugares, a todas as pessoas, a todos os sentimentos, a nós mesmos… É no fio da palavra que me equilibro. É na palavra que me seguro. É da palavra que vem meu sustento metafísico. É pela palavra que me salvo. É com a palavra que leio o mundo. É para a palavra que peço proteção. É a palavra que compõe os silêncios de quando rumino. A palavra anda na cabeça, anda na boca de todos os homens… A palavra cura feridas. A palavra abre feridas. A palavra enlouquece. A palavra traz sanidade. A palavra lança luz. A palavra lança sombras. A palavra faz rir. A palavra faz chorar. A palavra dá esperança. A palavra tira esperança. A palavra esclarece. A palavra confunde. A palavra acalenta. A palavra desespera. Parafraseando o grande Bartolomeu Campos de Queirós, autor do belíssimo livro que dá título a esta mensagem, digo que a palavra é meu porto, minha porta, meu cais, minha rota… Sem a palavra não sou (somos) ninguém. Viva a palavra!
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Tarlei Martins Ferreira
quarta-feira, 1 de agosto de 2012
Botafogo
NAS RUAS DO RIO
AS CASAS SINGELAS
TORNARAM-SE CONSULTÓRIOS
EMPRESAS, LABORATÓRIOS.
DÓI-ME A ALMA
VER SUAS FACHADAS
OFUSCADAS POR LÂMPADAS PROFANAS
PLACAS INTRUSAS
AVISOS DE QUE O APREÇO
MUDOU DE ENDEREÇO
AINDA TENHO ACESAS NA LEMBRANÇA
AS LUZES AMARELADAS
QUE DAS CASAS EMANAVAM
POR ENTRE CORTINAS RENDADAS.
AINDA SINTO O CALOR DOS ABAJURES
OUÇO O SOM DOS PIANOS, VITROLAS
CONVERSAS E RISADAS
QUE VASAVAM COMO ACORDES ABAFADOS
DA SINFONIA DAS INTIMIDADES.
EMBORA VIVESSE MAIS NOS BARES
BEBIA EM SEGREDO
O ACONCHEGO DOS LARES
SILENCIOSO E FURTIVO.
CAMINHAVA PELOS BAIRROS
ALIMENTAVA-ME DE JASMINS
EMBRIAGAVA-ME COM JARDINS.
IMAGINO OS CORREDORES INVADIDOS
QUARTOS VIOLADOS
TRANSFORMADOS EM DEPARTAMENTOS
COMPUTADORES E SECRETÁRIAS
NAS SALAS DE JANTAR
COPAS ECOZINHAS
COMO DEPÓSITOS, ALMOXARIFADOS
RECANTOS DESNUDADOS
INTERIORES DESTITUIDOS
DO ENCANTO DOS ABRIGOS.
COMO É DIFÍCIL ACEITAR
AQUELE ENTRA E SAI
DE GENTE QUE NADA SABE
DO SIGNIFICADO DOS PORTÕES
E QUE POR ELES PASSAM, BOVINOS,
MASCANDO A RELVA DAS RUÍNAS
PASTANDO INOCENTES
NO TESOURO DE TANTAS LEMBRANÇAS.
NÃO É O NOVO QUE CHORO
MAS A AUSÊNCIA DO ANTIGO
A HISTÓRIA QUE MORRE COMIGO.
AGORA, JÁ NÃO RIO.
AS CASAS SINGELAS
TORNARAM-SE CONSULTÓRIOS
EMPRESAS, LABORATÓRIOS.
DÓI-ME A ALMA
VER SUAS FACHADAS
OFUSCADAS POR LÂMPADAS PROFANAS
PLACAS INTRUSAS
AVISOS DE QUE O APREÇO
MUDOU DE ENDEREÇO
AINDA TENHO ACESAS NA LEMBRANÇA
AS LUZES AMARELADAS
QUE DAS CASAS EMANAVAM
POR ENTRE CORTINAS RENDADAS.
AINDA SINTO O CALOR DOS ABAJURES
OUÇO O SOM DOS PIANOS, VITROLAS
CONVERSAS E RISADAS
QUE VASAVAM COMO ACORDES ABAFADOS
DA SINFONIA DAS INTIMIDADES.
EMBORA VIVESSE MAIS NOS BARES
BEBIA EM SEGREDO
O ACONCHEGO DOS LARES
SILENCIOSO E FURTIVO.
CAMINHAVA PELOS BAIRROS
ALIMENTAVA-ME DE JASMINS
EMBRIAGAVA-ME COM JARDINS.
IMAGINO OS CORREDORES INVADIDOS
QUARTOS VIOLADOS
TRANSFORMADOS EM DEPARTAMENTOS
COMPUTADORES E SECRETÁRIAS
NAS SALAS DE JANTAR
COPAS ECOZINHAS
COMO DEPÓSITOS, ALMOXARIFADOS
RECANTOS DESNUDADOS
INTERIORES DESTITUIDOS
DO ENCANTO DOS ABRIGOS.
COMO É DIFÍCIL ACEITAR
AQUELE ENTRA E SAI
DE GENTE QUE NADA SABE
DO SIGNIFICADO DOS PORTÕES
E QUE POR ELES PASSAM, BOVINOS,
MASCANDO A RELVA DAS RUÍNAS
PASTANDO INOCENTES
NO TESOURO DE TANTAS LEMBRANÇAS.
NÃO É O NOVO QUE CHORO
MAS A AUSÊNCIA DO ANTIGO
A HISTÓRIA QUE MORRE COMIGO.
AGORA, JÁ NÃO RIO.
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Cristiano Menezes
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