sábado, 1 de janeiro de 2011

Capítulo IV

 

     Em minha temporada carioca anual, dia ensolarado, voltando do mar, ou melhor, da beira-mar por causa da poluição, reparo que, diante da pequena inclinação da areia, dou uma corridinha - seria para tomar impulso? Do portão da minha casa até à porta da entrada, venço a ladeirinha do mesmo modo, como uma menina. Não que desgoste da criança interior, mas, vou corrigir isso, pois, uma mulher tem que ter um molejo machucado, indolente e sensual. Vinicius tinha razão. E agora, curtirei a praia, guardando caneta e óculos. Onde está o estojinho deles? Sumiu dentro da bolsa! Impressionante como as coisas desaparecem e até notas, que escrevemos como lembretes, parecem ter ojeriza às pessoas de certa idade, ou curtem a brincadeira de esconde-esconde.
     Voltando da praia de ônibus, senta-se ao meu lado uma mulher, que me pergunta se o mar estava bom. Coisa de carioca que, tendo que trabalhar, quer ouvir que a água estava suja. Depois de satisfazê-la com o que queria escutar, despejei minha indignação de brasileira:
     - Vou escrever para "O Globo" e perguntar como o prefeito tolera que os ônibus indiquem a direção em inglês. Não sou xenófoba, mesmo porque sou tradutora e adoro ler em outras línguas, mas protesto contra o letreiro "Sugar Loaf" nos ônibus do Rio. Não se traduz nomes próprios. Vide "Taj Mahal", "Machu Picchu" e outros. De mais a mais, não devemos subestimar a capacidade de aprendizado do turista, nem sempre americano.
      A sugestão da professora de inglês, Maria Eugênia, a quem desabafei minha perplexidade, é a de que a informação do destino "Pão de Açúcar" fosse ladeada com uma foto do ponto turístico.
     - Perfeito!

     Já não o é o fato de um pai, estando na praia sob um calor escaldante, perguntar à filhinha se ela queria se molhar em um daqueles chuveiros na areia, em vez de simplesmente levá-la. A criaturinha nada entende de desidratação e insolação. Os pais devem ser mais afirmativos e tomar a decisão por seus pimpolhos, em inúmeras e diversas situações, como a hora de sair da praia ou a escolha do filme a ser alugado. De preferência,  não violento.
     - Alô, Mate limão gelado!
     - Sundow, protetor, Rayto!
     - Canga!
     - Picolé de fruta, um real!
     - Olha o Globo!
     - Sorvete Itália, Kibon!

     Quando passar o próximo vendedor, vou lhe sugerir apregoar as horas. Garanto que venderia mais, pois, no meio da enxurrada de vendedores, faria a diferença dando algo em troca.
     Abro o jornal para ver a informação sobre o estado da água do mar, se está própria ou imprópria para banhos, já que os coliformes fecais não são visíveis a olho nu, e me deparo com um comentário à carta que saíra publicada no jornal, complementada com um desenho do Pão de Açúcar!

                                                 Pão de Açúcar

     Respeito a carta de Angela de M. Delgado, mas não concordo em que Pão de Açúcar seja um nome próprio que não se possa traduzir. A residência do presidente americano, White House, tem nome português, Casa Branca. Os francófonos a chamam Maison Blanche, e em espanhol é Casa Blanca. A Torre Eiffel, em seu país é Tour Eiffel, e, para os anglo-saxônicos, Eiffel Tower. Então, é perfeitamente normal que o Pão de Açúcar tenha nome distinto em inglês (Sugar Loaf), como tem em francês (Pain de Sucre). Isso indica um claro interesse dos turistas pelo monumento: afinal, só se chama algo em nossa própria língua se nos interessa de verdade."

     O susto foi passageiro, porque logo brotou em mim a resposta:

     O senhor..................... em sua carta reforçou meu ponto de vista. Os americanos não dizem "Casa Branca"e sim "White House".
     Publiquei três livros e neles há algumas expressões em inglês, francês, citações em espanhol e em italiano. Não sou contra esse tipo de globalização. Questiono a inversão, no Brasil, pelos próprios brasileiros, dos respectivos itinerários das linhas de ônibus. Uma cidadã brasileira, não obrigada a saber inglês, querendo ir ao Pão de Açúcar, pode esperar muito no ponto, enquanto passam ônibus para "Sugar Loaf", que não lhe diz nada. A língua aqui ainda é o português, como a Torre Eiffel, em seu país, é chamada de "Tour Eiffel".
Bem lembrado!


  

0 comentários:

Postar um comentário

Seu comentário aguardará moderação